Como medir o risco psicológico das organizações?
Para incorporar o cuidado com a saúde emocional dos colaboradores à estratégia, as empresas devem responder a quatro perguntas
Na Europa, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o estresse ocupa a segunda posição entre os problemas de saúde relacionados ao trabalho, afetando aproximadamente 40 milhões de pessoas. Cerca de 50% a 60% de todos os dias de trabalho perdidos no continente estariam ligados a essa condição.
No Brasil, os transtornos mentais também estão em segundo lugar – já são a segunda causa de incapacidade para o trabalho, atrás somente de dores lombares e nos ombros, de acordo com o levantamento de concessões de auxílio-doença.
Esses dois dados nos levam a uma só conclusão: a empresa que ainda não colocou a saúde emocional dos colaboradores em sua agenda estratégica, além de perder uma boa oportunidade de estar em linha com o movimento de humanização que vem ocorrendo no universo corporativo, está, efetivamente, perdendo dinheiro.
“Vamos imaginar um líder que custa hoje R$ 20 mil mensais para a empresa, e que se afasta por seis meses. Só aí eu já vou ter um custo direto de R$ 120 mil, sem contar o indireto, com o time daquele gestor, de cinco a sete pessoas, que ficou sem líder”, explica Rui Brandão, CEO e cofundador do Zenklub, plataforma de desenvolvimento e saúde emocional.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, num cálculo em conjunto com a consultoria KPMG, o retorno do investimento (ROI) em ações preventivas de saúde mental é de 400%. Entretanto, para que este ROI seja observado, as empresas precisam resistir à tentação de investir somente em medidas paliativas – como aulas de meditação, salas de descompressão, entre outras – e, sim implementar programa estruturados, que sempre começam por um bom diagnóstico.
Diagnóstico de risco psicológico
Segundo o relatório “The pulse side of mental health”, produzido e divulgado pela consultoria EY Austrália em 2017, há quatro perguntas a que as organizações devem considerar responder quando procuram medir o risco psicológico no local de trabalho:
1. Os colaboradores percebem o local de trabalho como seguro e inclusivo? “Quando criamos ambientes nos quais o diálogo, o respeito, a transparência nas intenções, o alinhamento de expectativas e a coerência entre discurso e prática estão presentes, então, temos ações concretas que incentivam a saúde dos colaboradores de uma organização. O risco psicológico aumenta quando negligenciamos os sintomas gerados pelos aspectos tóxicos existentes em todas as organizações”, explica Renato Navas, cofunde e head de people success da Pulses, plataforma de people analytics para temas como engajamento, performance, cultura e employee experience.
2. Os funcionários percebem que têm controle/influência sobre como fazem o seu trabalho? “Quando as pessoas sentem que têm espaço para realizar suas atividades com autonomia, colocando em prática o que fazem de melhor e, simultaneamente, impactando positivamente na geração de valor à organização, então temos pilares fundamentais para uma relação saudável existir”, acrescenta Navas.
Como identificar se o colaborador tem essa percepção? Navas sugere algumas questões adicionais para serem respondidas pelos integrantes do time:
- Compreendo a visão da empresa e como o meu trabalho impacta no atingimento dela?
- Levando em conta todas as atividades, tenho clareza sobre o que gera maior valor à organização?
- Meu líder compreende e oferece o apoio necessário que eu preciso para executar minhas atribuições?
- Consigo colocar em prática minhas forças e talentos nas atividades que executo?
3. Conversas de qualidade sobre saúde mental estão acontecendo em toda a organização, de maneira formal e informal? De acordo com André Fusco, médico do trabalho formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, a falta de profundidade no tema faz as empresas tomarem decisões equivocadas. “É por isso que vivemos a epidemia das ‘salas de descompressão’. Pufes coloridos, aulas de meditação, salões de jogos e workshop de mindfulness viraram febre dentro das empresas. E a minha provocação é sempre a mesma: tudo muito legal, mas não vamos falar sobre o que está comprimindo o nosso pessoal?”.
Falar sobre saúde mental nesse contexto passa por discutir quais são os fatores que podem estar contribuindo para o adoecimento dos colaboradores, tais como excesso de trabalho, pressão demasiada, insegurança no emprego devido à crise sanitária no Brasil etc., e o que pode ser feito para que o trabalho não seja fonte de sofrimento. E essa conversa ganha ainda mais importância em tempos de pandemia, em que esses alívios do escritório não estão necessariamente disponíveis.
4. A educação sobre saúde mental foi incorporada ao dia a dia do colaborador da empresa? “Costumo dizer que saúde mental é uma questão muito mais próxima de educação do que propriamente de saúde. Se passarmos a olhar a saúde mental como um componente de desenvolvimento e não somente como um gatilho de tratamento de pessoas doentes, estaremos de fato educando as pessoas”, comenta Brandão.
Deixe um comentário